Concurso INSS: 'um a cada quatro se aposentam até 2022', diz diretor

O concurso INSS é tema do Folha Dirigida Entrevista desta quarta, 23. Diretor da Fenasps, Moacir Lopes fala da necessidade de edital.

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Publicado em:23/09/2020 às 18:00
Atualizado em:23/09/2020 às 18:00


Folha Dirigida: O INSS fechou 2019 com mais de 6 mil aposentadorias. E há mais de 34 mil cargos vagos? Qual é a situação hoje do INSS?

Moacir Lopes: O INSS está com uma defasagem de cinco anos sem concurso público. Estamos brigando desde 2015 para que fossem convocados todos os excedentes. 

Nós brigamos por isso até o último dia, quando o governo disse que não podia mais fazer convocações. Além disso, entre 2018 e 2019, o INSS perdeu 40% de seu quadro de pessoal ativo. 

Eram pessoas que estavam trabalhando e que poderiam ter ficado mais tempo, mas em função da política adotada pelo governo que não as motivava a permanecerem, saíram. Nós queríamos ter feito uma transição entre o concurso público novo e as pessoas que se aposentaram entre 2016 e 2017. 

No Ministério Público Federal está tramitando contra o INSS uma ação em que eles pedem a reposição de 21 mil vagas. É obrigação do Ministério Público, da Defensoria Pública da União e até do Ministério do Trabalho fazer essa cobrança da União. Porque a União por si só não se movimenta e precisa ser acionada constantemente. 

Então há um prejuízo para o INSS, há um prejuízo geral para o brasileiro nessa situação de espera para ser atendido, enfim. Há uma necessidade enorme de concurso público hoje no Brasil.

Folha Dirigida: O que você poderia falar para a gente sobre aposentadorias previstas para 2022? Há algum dado sobre isso?

Moacir Lopes: o INSS tem 21 mil e poucos trabalhadores e pode aposentar uma boa parcela deles. Um dado que pode ser indicador é que desse quadro uma faixa de 63% está no grupo de risco da pandemia.

São pessoas que podem se aposentar entre 2022 e 2030. A previsão das agências de notícias é que um em cada quatro funcionários poderão se aposentar até 2022.  Isso será um nocaute no serviço público.

Eu queria até explicar: em janeiro o governo lançou um decreto para contratar militares e aposentados. Nós brigamos durante quase quatro meses. No mês de abril caiu uma primeira lei, no mês de junho caiu a MP 922, que autorizava os contratos militares. 

Ainda assim, segundo dados do governo, conseguiram contratar em torno de 6 mil pessoas: 4 mil militares e outros 2 mil aposentados e outras categorias (os números do sindicalista divergem dos divulgados pelo Ministério da Economia, de 2,9 mil contratações). 

Mas não se sabe se todos entraram porque os dados não foram passados. Nem como isso foi feito já que o INSS ficou fechado seis meses por causa da pandemia. Então agora é que essas pessoas deverão se apresentar. 

No dia 14 começaram a abrir algumas poucas agências, eram para abrir 640, mas abriram em torno de 220. Os dados são instáveis, mas já existem militares em todo o Brasil. No Rio Grande do Norte, Espírito Santo, Paraná.

Folha Dirigida: Como tem sido a introdução desses militares e aposentados no INSS? Como tem sido a relação de trabalho? Quais funções eles têm assumido? Tem dado certo?

Moacir Lopes: O que nos foi passado pela equipe de governo é que os militares foram treinados nesse período. Eles ficariam no apoio aos que fazem a concessão e o atendimento. Mas ainda não temos certeza como vai ser isso porque todas as agências ainda não abriram. 

Por enquanto estão sendo realizados somente os atendimentos agendados. Essa situação com os militares ainda não dá para saber como vai ser, pois a primeira semana de trabalho começou agora no dia 14. Mas eles já estão nas agências. 

Folha Dirigida: Como essa demora no concurso público tem afetado a prestação de serviços e como isso tem afetado vocês que trabalham no INSS sabendo que um próximo edital poderá ser publicado somente a partir de 2022? E como está o diálogo da Fenasps com o governo para suprir essas vagas?

Moacir Lopes: Primeiro que nós temos uma demanda que está muito reunida no atendimento em massa dos beneficiários pelos trabalhadores do INSS. 

O INSS informa que mensalmente entram 3 milhões de pedidos. Então em 6 meses entram 18 milhões de pedidos. Somado a isso, há pedidos que tem vários problemas ou pendências. 

Acontece que o brasileiro às vezes depende de várias empresas para ter seus dados, e se o analista do INSS não tiver todos os dados certinho no sistema, ele não pode fazer o atendimento, do contrário pode até responder criminalmente por fazer uma concessão indevida. 

E o INSS ao não fazer concurso público sobrecarrega esses profissionais que estão lá. A autarquia também tem um sistema de metas que também sobrecarrega os servidores. 

E o que é pior: as condições de trabalho em si. O sistema do INSS é muito atrasado do ponto de vista da sua capacidade de atendimento global. A autarquia já fez vários projetos para atualizar isso, o último foi por volta de 2016 ou 2017, que foi abortado não sabemos o porquê. 

O governo não seguiu com esse projeto, apostou na digitalização de todo e qualquer serviço. Hoje 90% de serviços já são solicitados pelo Meu INSS, mas surgiu o problema: tudo que entra no sistema pela fila virtual vai acumulando. 

Como analisar sem funcionários em quantidade suficiente? Nós temos mais de mil agências no Brasil atualmente, se todas elas estivessem funcionando plenamente iríamos atender cerca de 100 mil pessoas por dia tranquilamente. Mas isso não acontece. 

O INSS não conseguiu resolver uma outra situação: o sistema Meu INSS não responde plenamente às dúvidas dos segurados. Nós já propusemos um debate sobre isso para podermos buscar ajuda. 

Se o presidente do INSS não consegue dinheiro com o Ministério da Economia para buscar mudanças, a gente vai buscar o Congresso. Afinal de contas, para nós o que importa é o trabalho em si, o cidadão. 

Saber que quem depende da Previdência é bem atendido para não precisar voltar lá diversas vezes e vai poder gozar da sua aposentadoria que é um direito. Concurso público é a saída para fazer isso. 

Se não houver trabalhadores cada vez mais vai ficar pior para quem fica trabalhando no INSS e para a população. Existem milhões de pedidos de benefício no sistema, é necessário que haja condições de fazer eles saírem rapidamente. 

O problema do retrabalho é outro. Por exemplo, eu sou aqui do Paraná, se eu pego um beneficiário do Amapá e ele tem alguma pendência de documento, ele entra em outra fila e o processo é todo realizado novamente. Até 2012, mais ou menos, o servidor fazia o serviço integral do beneficiário no sistema digital. Isso mudou.

Alguém vendeu para o Governo a ideia de que o digital resolvia. Mas nós sempre dissemos: o INSS é uma empresa complexa, uma legislação de 100 anos. Não é como um banco, por exemplo, que entrega o dinheiro e está tudo resolvido. 

O nosso não. Tem que analisar o documento, conferir se está correto, se não tem fraude, e dependendo ainda tem que mandar fazer algum tipo de pesquisa. Mas falta pessoal e falta dinheiro. Então a falta de funcionários no INSS hoje é muito séria. 

Folha Dirigida: no decorrer dos anos o tom do Governo mudou um pouco. Até certo tempo atrás nem se falava em concurso, apenas em digitalização. Mas agora já se fala em estudos para redimensionar o quadro e fazer concurso. Como está esse estudo?

Moacir Lopes: O que nos disse o Wagner Lenhart, Secretário de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia? Nós tivemos uma audiência em agosto (e deve ter uma outra agora, estamos marcando hora e dia) e o que ele nos passou foi o seguinte: que o Governo Federal está fazendo uma alteração no processo de trabalho da União que vai alterar toda essa forma de contratação, de organizar o sistema de trabalho. 

Nessa posição do Governo, ele quer dizer o seguinte: que ele vai estabelecer nova matriz salarial, novo teto, forma de contrato. Porque o concurso público, na Emenda 32, não é mais o único meio de contratação. 

Mas ao nosso ver isso é uma situação gravíssima, que leva o país a um total desmonte. Pode-se dizer que é um crime, você liberar cargos públicos que são importantes para a Administração Pública para terceirização ou, pior, indicação política. 

O que Rolim colocou é que está com o Governo essa discussão, que não passa por ele. E, de fato, o presidente do INSS hoje perdeu um pouco do poder que ele tinha. 

Quando tínhamos o Ministério da Previdência, toda a demanda do INSS ia para esse ministério e ele levava para o presidente. Hoje, vai para um secretário, que vai para outro secretário e aí sim chega no Ministro Guedes, Oxalá algum dia chega na Casa Civil. 

Então não há mais aquela agilidade, até porque o ministro Guedes tem dito que não precisa de concurso público. 

Mas a questão é a seguinte: segundo o IBGE, 35% da população não tem acesso à internet, mais os analfabetos funcionais, portanto quase 90 milhões de pessoas que não conseguem acessar a internet. 

Esse é o país do qual estamos falando. Então precisaria de funcionários para atender essa demanda. São pessoas que pagaram todos os meses pela sua previdência. Elas não podem ser menosprezadas pelo Governo. 

Folha Dirigida: o último concurso público já teve prazo de validade encerrado. Mas existe alguma chance, algum meio, de esses excedentes ainda serem chamados?

Moacir Lopes: Pois é, existe um grupo de aprovados no concurso de 2015 que faz um grande trabalho nesse sentido. Nós conseguimos um feito inédito em 2015, que chamou todos os profissionais do Serviço Social e todos aqueles que tinham sido aprovados no concurso anterior. 

Foram chamados basicamente quase o dobro. De lá para cá o governo tem jogado duro, porque ele não tem essa mesma visão do Estado. E a Justiça hora ela toma decisão, hora não se pronuncia. 

Nós temos duas Ações no Supremo Tribunal Federal discutindo essa questão do mérito do Governo contratar profissionais de forma terceirizada. O Supremo empurra para lá, empurra para cá, e vai jogando sem julgar. 

E não é só nossa Ação. É uma Ação coletiva de vários setores. Porque o governo tem feito contratações frequentemente. A União Federal tem um grande quadro de terceirizados em várias áreas de serviços. 

O Ministério da Saúde tem vários convênios contratados, chegava a ter mais de mil só em Brasília. Outros ministérios como a própria Economia e também o Ministério Público têm contratados. 

Porque eles não conseguem fazer concurso, então eles contratam essas empresas para algumas atividades. Então a Justiça tem sido muito assim. Por mais que ela tome uma decisão, ela não consegue empurrar para o Governo. 

A alegação é que ela não pode se inserir na matéria administrativa. Ainda assim, a questão judicial é um alento, uma esperança para que, ao julgar o mérito, possa obrigar o governo a contratar. Mas nesse governo agora a gente está tentando, primeiro ver o que ele quer fazer, e cobrar junto com o Ministério Público essas contratações.

Sobre os militares contratados do INSS há uma decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), de fevereiro, que questiona esses contratos. Porque não tinha uma lei que amparasse, só um decreto. 

O governo editou a Medida Provisória 922, enquanto ela teve vigência ele fez a seleção, montou os contratos, chamou as pessoas que agora estão se apresentando no INSS. Ainda não sabemos quantos se apresentaram efetivamente, quantos estão trabalhando.

Mas essa situação ainda não está resolvida, nós vamos cobrar do Tribunal de Contas o que aconteceu. Se tem algum acordo previsto. Pela legislação brasileira, infelizmente, enquanto há vigência da Medida Provisória, os efeitos dela têm essa garantia legal.

Só que há um detalhe: teve um problema denunciado, que o INSS contratou profissionais em plena pandemia quando tinha um decreto proibindo. Isso é válido ou não? Essa é uma discussão que está tendo lá no Tribunal.

Dizem que vai haver um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) envolvendo o INSS, o Tribunal de Contas, o Ministério Público da União e DPU. Nós vamos discutir isso com eles depois também, a Federação vai apresentar um debate.

Como essa ação foi movida por outra Associação, a gente não sabe o que aconteceu. Mas essa informação está na mídia e temos a decisão do TCU questionando esses contratos. O fato é que, em tese, não poderia contratar durante a pandemia. Mas como a lei tinha permitido fazer aquela seleção, a gente não tem certeza até onde se aplica isso. 

Folha Dirigida: além da convocação de excedentes, existe algum outro caminho para fazer contratações antes de serem encerrados esses contratos com os militares?

Moacir Lopes: bem, eu sempre faço analogia ao que fizemos no passado. Entre 1998 e 2003 tivemos 5.900 contratados. Essas pessoas trabalharam na Previdência por cinco anos.

O governo tem essa prerrogativa, ele pode baixar um decreto tendo em vista o estado de calamidade e pode contratar para qualquer área. A lei ampara.

Agora, que vai acontecer nesse governo especificamente, só após a Reforma Administrativa ou após a mudança na lei que eles irão contratar. Nós da Fenasps estamos apostando no inverso. Acreditamos que essa reforma não vai passar e a gente vai tentar que eles façam concurso. Para incluir na lei de diretrizes orçamentárias dinheiro para concurso mesmo.

Teve concurso para a Polícia Federal, teve recentemente concursos para preencher algumas vagas de tribunais. Então ele pode fazer para o INSS. É uma decisão política do governo não fazer concursos. E o INSS precisa.

É a maior autarquia que temos de atendimento do governo. Então o INSS não só pode como deveria fazer concurso público, mas isso não está acontecendo. E nós estamos comprando essa briga porque para nós Vale pensar no futuro da autarquia. Se chegar lá na frente e ela não estiver funcionando...

Mais uma coisa que não falei aqui: o governo trabalha com duas hipóteses: fez portaria unificando o trabalho do INSS o Ministério do Trabalho e Emprego. Em tese isso aumentaria o contingente de funcionários mas também não há servidores no ministério tá quase vazio. Ouvir a PEC da reforma da Previdência, com o artigo para criar uma unidade gestora de fundos.

Essa unidade gestora de fundos seria também um INSS. São coisas que vão acontecer e nós estamos alertando os deputados sobre esse debate. INSS não pode virar um fundo de previdência privada. É uma autarquia que desenvolve um trabalho muito sério e muito importante para a população. BPC auxílio-doença auxílio maternidade isso não pode virar um fundo de Previdência. 

Folha Dirigida: Ao que parece a categoria tem se movido constantemente no sentido de pleitear esse concurso público. É isso mesmo?

Moacir Lopes: Estou há 36 anos nesse trabalho. E concurso público assegura condições seguras de trabalho, trabalho não precarizado, autonomia a não ser pressionado como aconteceu com fiscais do IBAMA.

O Brasil é um dos países que menos têm trabalhadores, cerca de 1.6% de funcionários públicos em relação à população. O Japão tem 5%, Alemanha tem 7%, os Estados Unidos têm 15% e a Dinamarca tem 29% .

Então o servidor público, além de gerar riqueza e garantir atendimento, ele garante cidadania e também decência e garante ao cidadão o seu direito pleno. Esse é o trabalho do servidor público. 

Folha Dirigida:  A pandemia do novo coronavirus acabou evidenciando a necessidade de contratações no INSS. Você acredita que após essa crise o governo poderá olhar melhor para essa questão e avaliar realmente a necessidade de um novo concurso? E o que a Federação pensa a respeito da possibilidade de contratar temporários?

Moacir Lopes: Para nós o mais importante é ter pessoas para trabalhar por um período mais longo. Um temporário pode ficar por 23 anos e logo depois sair. Aí o problema será dobrado porque vai esvaziar ainda mais o quadro e não teremos o serviço para fornecer para a população.

O que defendemos aqui na discussão: não temos nada contra contratar quem quer que seja, mas sim contra o modelo como isso se dá. Os públicos deveriam ser o único mecanismo para ingresso desses Trabalhadores. O Governo está construindo uma nova estrutura para o INSS mudanças, governo chegou a divulgar um estudo e depois disse que não será mais aquele, segundo o qual iriam fechar mais da metade das agências do Brasil, quais os 700 delas.

Alegavam que não seriam mais necessárias. Como são essas decisões são feitas com base em teses nem sempre se efetivam na realidade. No fundo toda essa demanda de pessoas na fila esperando demonstrou uma coisa: sem profissional para atender não vai resolver a demanda do INSS. 

Trabalhos precários, milhões de pessoas desempregadas, muitas delas tem direito previdenciário porque tem carência ainda. Há também o auxílio-doença. Isso não vai parar. Não adianta querer enxugar gelo.

Queremos negociar com deputados e marcar uma audiência pública na Câmara e no Senado para chamar o presidente e ele explicar a senadores e deputados o que está acontecendo. Falam em entrevistas que está tudo bem, mas não é o que se vê. Por aí não é realidade.

Nos últimos cinco anos a primeira vez que eu vi um secretário em uma agência foi na última segunda-feira. A nossa parte vamos lutar a cada dia e a cada minuto pela realização de um concurso público, não desistiremos. Não por uma questão de pirraça, mas por princípios. O Brasil precisa de bons profissionais aprovados em concurso para garantir cidadania.

Folha Dirigida:  Muitas pessoas gostariam que o governo aproveitasse os excedentes do último concursoA Fenasp apoia contratar esses aprovados? Isso faz parte da pauta que a categoria tem apresentado para o governo federal? 

Moacir Lopes: Quando o concurso estava vencendo, nós mandamos a demanda para todos os órgãos de governo, chegou na mão do Temer, chegou na mão do Eliseu Padilha, e colocamos isso na pauta de forma bem contundente.

Brigamos com o ministério da Economia, falamos com o Rodrigo Maia que estava lá na época, falamos também com vários senadores e eles disseram que iam ver com o governo.

Mas o governo não se movimentou nessa direção. O presidente do INSS que entrou nesse governo, Renato Vieira,  nos disse no primeiro mês que seria difícil eles poderem revalidar esse concurso de 2015. Mas se fosse decidido judicialmente, a convocação seria cumprida.

Eles disseram isso para nós. Já o novo presidente, Leonardo Rolim, não mencionou mais isso. Mas toda reunião que temos com representantes do governo nós colocamos os concursos em pauta.

E a gente espera que os deputados, que agora vamos chamar para uma audiência pública, cobrem do presidente um concurso. E quem sabe façam uma moção cobrando. Porque a arrecadação que a Previdência Social faz no Brasil chegou a quase um trilhão, só começou a cair porque como o desemprego ninguém paga a Previdência como antigamente.

Então estamos com essa demanda do concurso de 2015, levamos sim para o governo, mas o presidente atual não tocou no assunto. Ele apenas disse que enquanto não houver a reestruturação do INSS não poderá fazer concurso. Depois tiraram da cartola a contratação de militares, o que não resolveu nada. 

Folha Dirigida: tendo em vista essa notícia de que o INSS vai fazer um re dimensionamento do quadro e poderá abrir um concurso a partir de 2022, como vocês tem visto a administração atual do INSS? Eles demonstram boa vontade para fazer essa reestruturação e esses estudos do quadro?

Moacir Lopes: Não sei respeito do que eles vão fazer sobre isso. Em relação aos militares, nós tentamos derrubar na justiça, entramos com mais de dez ações. Inclusive colocamos na nossa ação que há os aprovados no concurso de 2015 que poderiam ser chamados. Em seguida veio a medida provisória 922.

Com isso o debate ficou um pouco travado. A pandemia também travou tudo, diminuindo qualquer discussão sobre o concurso público.

O Leonardo Rolim também assumiu o INSS no início desse ano e logo em seguida veio a pandemia, com o trabalho remoto. Nesse modelo de trabalho aumenta a produção. Minhas internet de casa, por exemplo, ainda que seja ruim, é mais potente que a do INSS.

Um processo que na agência eu levo quatro minutos para abrir, aqui abre em 4 segundos. Então, em 2019 tinha cerca de 2,4 milhões de processos na fila. Essa fila chegou a menos de 1,1 milhão. Com isso, então, eles acham que não vai mais precisar de concurso.

Mas nós vemos o contrário. Muitos dos que estão em casa já estão até com problemas de saúde, o que não foi nem identificado ainda, porque não é feito exame periódico. Porque o estresse é muito grande.

As pessoas chegam a trabalhar 15 horas por dia. Isso é um crime contra a saúde do servidor. E o concurso público é uma saída. Agora não há mais argumento para não fazer, há apenas argumentos políticos. Concurso público também evita fraude, desvios e outras situações mais. 

Folha Dirigida: há uma insistência em dizer que a fila do INSS é um problema pontual. Você, com 36 anos de carreira, concorda? Essa é uma demanda passageira? Essa demora por concurso tem atrapalhado?

Moacir Lopes: a fila é histórica na questão da previdência. Até os anos 80 eram menos pedidos. Após a Constituinte começou a aumentar o número de pessoas que foram se aposentando.

Então a fila virou um lugar comum e nunca foi reduzida, porque os governos nunca investiram de forma adequada. Depois houveram algumas reformas ao longo dos anos que deram vazão a uma demanda reprimida com mais pessoas querendo aposentar.

Então essa fila não é pontual. Ela é permanente. Porque se entram 3 milhões de benefícios e não são analisados 3 milhões com a mesma velocidade, em algum lugar a demanda vai acumular. 

Folha Dirigida: como a categoria recebe a Reforma Administrativa, proposta pelo Governo Federal? 

Moacir Lopes: o governo Temer também quis fazer essa Reforma Administrativa. Só passou a Trabalhista porque não conseguimos uma unidade com todo mundo.

Essa PEC 32 que surgiu agora com a proposta do governo reestruturar o serviço público como um todo, na prática ela acaba com a estabilidade, o prazo do estágio probatório, cria um sistema de avaliação subjetivo (avaliação tem que ser um processo muito sério, não pode ficar a critério de uma única pessoa).

O governo colocou então uma pegadinha: não vai afetar os atuais servidores. Isso não é verdade. Ela afeta todos os 12 milhões de servidores só da União. Eles querem desmontar o estado para aumentar a terceirização.

E o ministro Paulo Guedes costuma ser muito pejorativo ao se referir a servidores públicos. Bravatas que não fazem sentido. Mentiras que eles contam, mas a principal delas é dizer que o servidor público atual não precisa lutar.

No próximo dia 30 de setembro haverá um ato em todo o Brasil para avisar ao cidadão que onde passar a reforma não haverá professor, escola pública, nem saúde pública. O SUS é uma demonstração do quão importante é o serviço público para a população. 

Folha Dirigida:  Como  a Fenasp tem lutado para que essa Reforma Administrativa seja o menos prejudicial possível para o atual servidor e os futuros?

Moacir Lopes: primeiro tem uma questão que ainda vai para debate. O Supremo Tribunal Federal, há pouco mais de quatro ou cinco meses, julgou uma ação que já estava tramitando há pelo menos uns cinco anos lá. Que diz que é proibido haver redução de salário do servidor público, com base na Constituição.

Segundo, para demitir o servidor, é preciso um inquérito. A nossa luta é tentar primeiro nossa via de mobilização para que essa PEC não avance como o governo espera que ela avance. Nós temos esperança de derrotar essa reforma e ao mesmo tempo garantir que concurso público seja único meio de acesso para trabalhar na União.

Folha Dirigida: qual sua posição sobre o fim do Regime Jurídico Único e a criação dos cinco vínculos distintos de trabalho que está sendo proposto?

Moacir Lopes: o RJU é uma garantia do estado para ele poder ter servidor, que vai ter direitos e deveres. Na mídia se fala que servidor só tem direito, mas isso é mentira. Servidor trabalha muitos mais do que mostram lá.

Essa questão de vínculo que o Guedes quer inventar ali quer dizer que vai ter um grupo pequeno que vai ser carreira de estado, um grupo de área de relações internacionais e afins, e vai ter um grupo intermediário.

Ele diz que o trabalho do servidor público em geral, como o de técnico e analista por exemplo, é descartável. E isso não é verdade. Não existe solução fácil, A não ser que todos os brasileiros tenham internet em casa boa, informação e estivessem integrados no sistema. Esses milhões de pessoas estão fora do mundo da tecnologia e não dá para mudar isso rapidamente.

E ainda que isso seja possível em anos, ainda assim vai precisar de gente aqui. Porque máquina não aposenta ninguém. Máquina não cuida de gente lá no hospital e máquina não vai atender vocês. A inteligência artificial ainda está anos luz de substituir o cidadão. 

Folha Dirigida: há também um debate sobre a reestruturação de carreira e se fala em mudar a escolaridade do técnico para o nível superior. Você acredita que um próximo concurso para o INSS pode vir com essa mudança?

Moacir Lopes: olha, ainda é muito difícil ter essa avaliação. Hoje, pela lei, pode contratar os dois. Teve, inclusive, um concurso que entrou vários trabalhadores de nível superior. mAS Por enquanto está proibido por algumas leis. Primeiro pela PEC 95 que não permite ampliar muito o gasto público com o servidor.

E depois foi aprovada a Lei Complementar 173, que ia repassar benefícios para estados e municípios, e nessa ele inclui todos os trabalhadores da União, que até o final de 2021 não se pode dar qualquer benefício para trabalhadores .

Então, será necessário haver uma mudança nessa lei primeiro, para voltar a olhar para essa questão da reestruturação de carreira. Até podem debater isso agora, mas mudar isso ainda não pode fazer. 

Folha Dirigida: as pessoas que estão estudando podem acreditar que esse concurso irá realmente sair em 2022?

Moacir Lopes: nesse governo é difícil prever a movimentos por mais que um mês. Cada mês ele vem com uma mudança nova. Então eu não tenho certeza de como vai ficar o país, até por conta dessa grande crise que estamos passando. Mas uma coisa é certa: não existe como garantir concurso, se não for uma demanda do estado. O estado precisa.

Agora, o estado também é o cidadão, que pode também fazer esse trabalho de pressão aos deputados, cobrar. E nós acreditamos, sempre, que é sim possível fazer o concurso. Se não puder sair agora, sai no meio do prazo. E quem não estiver se preparando, não vai passar.

Porque aumentou muito a concorrência nos concursos, por conta da demanda de trabalho. Única coisa que tenho a dizer é que tenham esperança, que estejam preparados e que lutem por isso. 

Folha Dirigida: tem alguma reunião agendada com representante do Ministério da Economia a curto prazo?

Moacir Lopes: está para sair uma até outubro. Nessa reunião também vamos apresentar a pauta do concurso em um dos itens de discussão, para que o ambiente de trabalho fique mais adequado e as pessoas tenham um trabalho decente.

Folha Dirigida: e em relação aos aprovados do concurso de 2015?

Moacir Lopes: o que a gente apresenta para o governo sempre é que, se não tem como fazer concurso novo, chamem os que já passaram em edital anterior. Já houve concursos que chegaram a  ficar sete ou oito anos em vigência. Mudou-se um pouco a lei, mas se a União quiser ela pode fazer isso. Eu não sei o que farão o Guedes e o Bolsonaro. Da nossa parte, a demanda está na mesa.

Folha Dirigida: acredita que o INSS pode repetir essa espera de mais de dez anos aguardando um concurso público? 

Moacir Lopes: mudando a política, muda todo o sistema. o Governo alega que não tem dinheiro, mas sabemos que ele paga 1.4 trilhões de juros anuais, então dinheiro tem. É só definir como vai fazer a conta. 

Dinheiro tem, então faça concurso. Se não for agora, mais para frente. Nós vamos continuar pressionando. Agora, não fica esse tempo todo. Não há como ficar. A não ser que fechassem o órgão.

Sumário